Reino do Algarve



O Reino do Algarve, ou, após 1471, Reino dos Algarves, foi um reino nominal dentro do Reino de Portugal, localizado na região mais meridional de Portugal continental, até o fim da monarquia em 1910. A partir de 1815, foi um dos reinos integrantes ao Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves, que durou até 1822, quando voltou a ser Reino de Portugal e Algarves.[3]

Reino do Algarve

1242 – 1910
FlagBrasão
BandeiraBrasão
Localização de Algarve
Localização de Algarve
ContinenteEuropa
CapitalSilves (1249–1576)
Lagos (1576–1755)
Tavira (1755–1823)
Faro (1835–1910)
Língua oficialPortuguês
ReligiãoCatolicismo
GovernoMonarquia absoluta (1249–1820; 1823–1825; 1828–1834)
Monarquia constitucional (1820–1823; 1825–1828; 1834–1910)
Monarcas
 • 1249–1279D. Afonso III
 • 1816–1826D. João VI
 • 1908–1910D. Manuel II
História
 • 1242Fundação
 • 1249Conquista de Silves
 • 1406Criação da comarca do Algarve: o Algarve aparece, pela primeira vez, como divisão administrativa[1])
 • 16 de dezembro de 1815Fundação do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves
 • 24 de agosto de 1820Revolução Liberal
 • 23 de setembro de 1822Aprovação da Constituição do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves
 • 29 de abril de 1826Implantação do Reino de Portugal e dos Algarves com a outorga da Carta Constitucional portuguesa de 1826
 • 1836Criação do Distrito de Faro
 • 5 de outubro de 1910Implantação da República Portuguesa
Área
 • 1900[2]5 019 km2
População
 • 1900[2] est.257 378 
     Dens. pop.51,3 hab./km²
Arco do Repouso nas Muralhas de Faro, onde terá repousado (de acordo com uma lenda) D. Afonso III no "fim" da Reconquista

História

O Algarve (do árabe "Algarbe Alandalus", Algarbe, «o Ocidente»; do "Al-Andalus"), foi considerado, durante séculos e até à proclamação da República Portuguesa em 5 de outubro de 1910, como o segundo reino da Coroa Portuguesa — um reino de direito separado de Portugal, ainda que de facto não dispusesse de instituições, foros ou privilégios próprios, nem sequer autonomia — na prática, era apenas um título honorífico sobre uma região/comarca que em nada se diferenciava do resto de Portugal.[4]

Note-se, porém, que nunca nenhum rei português foi coroado ou saudado como sendo apenas "Rei do Algarve" — no momento da sagração, era aclamado como "Rei de Portugal e do Algarve" (até 1471), e mais tarde como "Rei de Portugal e dos Algarves" (a partir de 1471).

Primeira conquista

O título de "Rei do Algarve" foi pela primeira vez utilizado por Sancho I de Portugal, quando da primeira conquista de Silves, em 1189. Silves era apenas uma cidade do Califado Almóada, posto que nesta altura todo o Al-Andalus se achava unificado sob o seu domínio. Assim, D. Sancho usou alternadamente nos seus diplomas as fórmulas "Rei de Portugal e de Silves", ou "Rei de Portugal e do Algarve"; excepcionalmente, conjugou os três títulos no de "Rei de Portugal, de Silves e do Algarve".

O único motivo que pode justificar esta nova intitulação régia prende-se com a tradição peninsular, de agregar ao título do monarca o das conquistas efectuadas (assim, por exemplo, os Reis de Leão e Castela eram também "Reis de Toledo, de Sevilha, etc.")

Com a reconquista muçulmana de Silves, em 1191, o rei cessou de usar este título.

Reconquista

Ver artigo principal: Conquista do Algarve

O Califado Almóada viria a desagregar-se na Hispânia em 1234, dissolvendo-se em vários pequenos emirados, as taifas. O Sul de Portugal ainda em mãos muçulmanas ficou anexado à taifa de Niebla, na moderna Espanha; o seu emir, Muça ibne Maomé ibne Nácer ibne Mafuz, proclamou-se pouco tempo mais tarde "Rei do Algarve" (amir Algarbe), posto que o seu Estado compreendia, de facto, a região mais ocidental do Al-Andalus muçulmano.

Ao mesmo tempo, as conquistas portuguesas e castelhanas para o Sul prosseguiam. No reinado de D. Sancho II conquistaram-se as derradeiras praças alentejanas e ainda a maior parte do Algarve moderno, na margem direita do rio Guadiana; à data da sua deposição e posterior abdicação, restavam do Algarve muçulmano apenas pequenos enclaves em Aljezur, Faro, Loulé e Albufeira, os quais, devido à descontinuidade territorial e à distância que os separava de Niebla, se tornaram independentes do seu domínio.

Assim sendo, de facto, Sancho II de Portugal afigurar-se-ia como o segundo rei português a poder usar o título de Rei do Algarve, na esteira de seu avô — o que provavelmente só não fez devido às suas outras preocupações internas, designadamente a guerra civil que o opôs ao seu irmão, o conde de Bolonha e infante Afonso.

Com efeito, foi este que, subido ao trono em 1248, se encarregou da conquista dos derradeiros enclaves mouriscos no Algarve, assumindo em 1249 o título de "Rei de Portugal e do Algarve", que não mais deixaria de ser utilizado pelos seus sucessores até ao fim da monarquia em Portugal.

O rei de Niebla e emir do Algarve, para obstar às conquistas perpetradas pelos Portugueses nos seus territórios, fez-se vassalo de Afonso X de Castela (o qual passou por isso também a usar o título de Rei do Algarve entre as suas múltiplas conquistas), cedendo-lhe o domínio do Algarve português. Assim, muito provavelmente, a intitulação de Afonso III de Portugal serviria como reacção a esta tomada de posição pelo vizinho castelhano, destinando-se a fortalecer os direitos do monarca português sobre a região em causa (pois que, como já foi dito, à intitulação e ao estatuto de reino não correspondia nem foros nem privilégios nem autonomia própria).

A questão acabou por ser dirimida entre os soberanos de Castela e de Portugal, pelo tratado de Badajoz de 1267; o rei Afonso X desistia das suas pretensões sobre o antigo Algarbe Al-Andalus, fazendo do seu neto D. Dinis o herdeiro do trono do Algarve, o que ditava a sua incorporação a prazo na coroa portuguesa. Reservava, porém, a utilização do título por si e pelos seus descendentes, dado ter adquirido em 1262 os restos do reino de Niebla/ Algarve, situados já além do Odiana – os demais reis de Castela, e depois da Espanha, até à subida ao trono da rainha Isabel II (1833), continuaram a usá-lo entre os seus diversos títulos.

Além-mar

Em Portugal, o nome do reino algarvio (e o título régio, por consequência), sofreram algumas pequenas mudanças oficiais com as conquistas norte-africanas, cujo território era considerado o prolongamento natural do Reino do Algarve. Assim, João I de Portugal acrescentou à sua intitulação de "Rei de Portugal e do Algarve", o nome de "Senhor de Ceuta"; seu neto Afonso V, por sua vez, chamou-se sucessivamente "Senhor de Ceuta e de Alcácer-Ceguer em África" (após 1458), e em 1471, com a conquista de Arzila, Tânger e Larache, reuniu as praças norte-africanas no título de "Algarve d’além-mar em África", ficando o Algarve europeu a ser o "Algarve d’aquém-mar".

Assim, foi só em 1471 que o "Reino do Algarve" deu lugar ao "Reino dos Algarves", devido à elevação dos senhorios norte-africanos da coroa portuguesa à condição de reino. Os reis de Portugal adoptaram por conseguinte o título que viriam a usar até à queda da Monarquia: "Reis de Portugal e dos Algarves d’aquém e d’além-mar em África" — isto mesmo depois do abandono da última praça marroquina em mãos portuguesas (Mazagão, em 1769).

Conflitos oitocentistas

Caricatura representando D. Pedro IV e D. Miguel I a brigar pela coroa portuguesa, por Honoré Daumier, 1833.

No Século XIX, os graves confrontos entre Liberais e Absolutistas, causaram lutas fraticidas. A invasão dos liberais Portugueses deu-se pela costa Algarvia, tendo sido Cacela o sitio escolhido. Após o fim da guerra civil e feita a convenção de Évora Monte, José Joaquim de Sousa Reis (o Remexido), capitão miguelista tentou entregar as armas à nova autoridade liberal, mas foi perseguido assim como a sua família. Revoltado depois de terem queimado a sua casa e terem assassinado seu filho de apenas 10 anos, fugiu para as serras algarvias com centenas de outros perseguidos iniciou um extraordinário movimento de guerrilha, intensificando-se nos anos entre 1834 e 1838. Em 26 de novembro de 1836, D. Miguel no exílio, nomeia Remexido como "Governador do Reino do Algarve" e "Comandante em Chefe Interino de Todas as Tropas Realistas, Regulares e Irregulares do Exército de Operações do Sul". Foi no entanto capturado e, apesar do indulto da rainha, fuzilaram-no em Faro, no dia 2 de Agosto de 1838.

Apesar de tudo o Reino do Algarve foi formalmente dissolvido em 1834 com a extinção do posto do Governador das Armas do Reino do Algarve, tendo com a criação do distrito de Faro em 1835 sido criado o cargo de governador civil do correspondente distrito.

Apesar de tudo, na titulatura régia os reis de Portugal continuaram a usar o título de Rei dos Algarves até à abolição da Monarquia em 1910. Curiosamente, hoje em dia os Reis de Espanha também mantêm o Algarve nos reinos da sua titulatura régia.

Lista de reis do Algarve

Niebla / Algarve

Portugal

Castela / Espanha

Lista de Governadores do Algarve

Lista em conformidade com vários documentos (Tavira e o seu Termo,[5] Corografia, ou, Memória económica, estatística e topográfica do reino do Algarve[6]). Muitos governadores serviram também como provedores da Misericórdia de Lagos,[7] pelo menos enquanto tinham o seu palácio em Lagos.

Governadores do Algarve
(Nascimento–Morte)
RetratoTempo em funçõesNotas
Governadores do Algarve com sede em Lagos (1573–1755)
1Diogo de Sousa
(-)
15731578Primeiro governador do Algarve
2Francisco da Costa
(–)
15781580
3Duarte de Menezes (1.ª vez)
(1537–1588)
15801581
4Martim Correia da Silva, alcaide de Tavira
(–)
15811583Da família dos Correias da Silva, alcaides de Tavira
5Duarte de Menezes (2.ª vez)
(1537–1588)
15831584
Fernão Telles de Meneses
(1530–1605)
15841595
Rui Lourenço de Távora
(1556–1616)
15951606
Diogo de Meneses, 1º conde da Ericeira
(–)
16061606
Manuel de Lencastre
(–)
16061614
João de Castro
(–)
16141621?
Luís Tomé (filho do anterior)
(–)
1621?1622?
Afonso de Noronha
(–)
?1623
Pedro Manuel, conde da Atalaia
(–)
16231624
João Furtado de Mendonça
(–)
16241630
Luís de Sousa, Conde do Prado
(–)
16301633
Gonçalo Coutinho
(–)
16331638
Henrique Correia da Silva, alcaide de Tavira
(–)
16381641Da família dos Correias da Silva, alcaides de Tavira
Vasco de Mascarenhas, 1º conde de Óbidos (1.ª vez)
(1605–1678)
16411642Primeiro governador nomeado após a restauração
Martim Afonso de Melo
(–)
16421646
Nuno de Mendonça, conde de Vale de Reis (1ª vez)
(–)
16461646Da família dos Mendonças, condes de Vale de Reis
Vasco de Mascarenhas, 1º conde de Óbidos (2.ª vez)
(1605–1678)
16461648
Francisco de Melo
(–)
16481651
Nuno de Mendonça, conde de Vale de Reis (2ª vez)
(–)
16511658
Martim Correia da Silva, alcaide de Tavira
(–)
16581663Da família dos Correias da Silva, alcaides de Tavira
Luís de Almeida, 1.º conde de Avintes
(–)
16631667
Nuno de Mendonça, conde de Vale de Reis (3ª vez)
(–)
16671671
Nuno da Cunha de Ataíde, conde de Pontével
(–)
16711675
Simão Correia da Silva, Conde da Castanheira
(–)
16751679Da família dos Correias da Silva, alcaides de Tavira
Luís da Silveira, conde de Sarzedas
(–)
16791682
Francisco Luís da Gama, 2.º Marquês de Niza
(–)
16821692Conde da Vidigueira
Eugénio Aires Saldanha Meneses e Sousa
(–)
16921699
Fernando de Mascarenhas, 2.º Marquês de Fronteira
(–)
16991701
António de Almeida, 2.º conde de Avintes
(–)
17011703
João de Lencastre
(–)
17031707
Fernando de Noronha, 8.º Conde de Monsanto
(–)
17071716
Martim Afonso de Melo, 4.º Conde de S. Lourenço
(–)
17161718
Belchior da Costa Rebelo
(–)
17181719(interino)
José Pereira de Lacerda, Bispo do Algarve
(–)
17181720
João Xavier Teles de Meneses, Conde de Unhão
(–)
17201742
Luís Peregrino de Ataíde , 10.º Conde de Atouguia
(–)
17421750
Afonso de Noronha (governador do Algarve)
(-)
17501754
Governadores com sede em Tavira (1755–1834)
Rodrigo António de Noronha e Meneses
(-)
17541762Com o terramoto, viu morrer o filho, e devido aos estragos da cidade de Lagos, e após consultar o rei, entendeu mover a sede para Tavira [8]
Henrique de Meneses, 3º Marquês do Louriçal
(-)
17621765
Tomáz da Silveira e Albuquerque Mexia
(-)
17651773
José Francisco da Costa e Sousa
(-)
17731782
Agostinho Jansen Moller, brigadeiro
(-)
17821782(interino)
António José de Castro , 2º Conde de Resende
(-)
17821786
Nuno José de Mendonça e Moura , 6º Conde de Vale de Reis
(-)
17861795Da família dos Mendonças, condes de Vale de Reis
Francisco de Melo da Cunha de Mendonça e Meneses , conde de Castro Marim,
(-)
17961808Mais tarde Marquês de Olhão, chefiou as tropas que se insurgiram no Algarve contra a invasão de Junot em 1808
Francisco Gomes do Avelar, Bispo do Algarve
(-)
18081816(interino)
John Austin, coronel inglês
(-)
18161817(interino)
Francisco José da Fonseca, coronel
(-)
18171820(interino)
Diocleciano Leão Cabreira, brigadeiro, depois Barão de Faro
(-)
18201821(interino)
Sebastião Drago Valente de Brito Cabreira, brigadeiro
(-)
18211823(irmão do anterior)
José Correia de Mello, brigadeiro
(-)
18231824
João de Noronha Camões de Albuquerque Sousa Moniz , Marquês de Angeja
(-)
18241826
Conde de Alba
(-)
18261828
Luís Inácio Xavier Palmeirim, tenente-coronel
(-)
18281828
Francisco de Borja Garção Stockler, tenente-general, depois Barão de Vila da Praia
(-)
18281829
Maximiano de Brito Mouzinho, marechal de campo
(-)
18291830
Conde de Santa Marta
(-)
18301830
António Vieira de Tovar de Magalhães e Albuquerque,Conde de Molelos
(-)
18301833
Governador após a Guerra Civil Portuguesa (1832-1834)
António Pedro de Brito Vila Lobos, 1º Barão de Cacela18341835Único governador nomeado após a vitória dos liberais, cargo extinto após as reformas
José Joaquim de Sousa Reis, marechal de campo
(-)
18341838Apenas em título, nomeado pelo deposto rei Miguel I no exílio

Brasões de armas municipais do Algarve

Brasão das Armas do Reino do Algarve (in Atlas Contractus, de 1667)

Em recordação do antigo estatuto de reino, a maior parte dos actuais brasões municipais (e, igualmente, de algumas freguesias) do Algarve têm como elementos principais a cabeça do rei mouro e do rei cristão que ornamentavam o antigo (e putativo) brasão de armas do reino do Algarve. A par da representação do açor nos brasões dos Açores e de uma estrela nos municípios da Serra da Estrela, esta é uma das poucas regiões naturais do país que faz uso de um símbolo heráldico distintivo, ao qual apenas os municípios de Faro, Lagos e Olhão escapam.

Fontes históricas

Ver também

Referências

Ligações externas